“Cinema Paradiso”: Memórias, amizade, lágrimas e amor pelo cinema
Filme: Cinema Paradiso, 1988
Direção: Giuseppe Tornatore
Elenco: Philippe Noiret, Salvatorio Cascio, Marco Leonardi, Jacques Perrin, Agnese Nano
Um novo talento do cinema italiano
O cinema italiano sempre fez surgir grandes talentos, seja na direção de filmes e também na atuação de atores. Diretores como Federico Fellini, Michelangelo Antonioni, Luchino Visconti, Bernardo Bertolucci, Pier Paolo Pasolini e outros, e atores como Alberto Sordi, Julieta Massina, Marcelo Mastroiani, Sofia Loren, todos contribuíram para engrandecer o cinema mundial.
Nos anos 80, um novo e genial cineasta apareceu: Giuseppe Tornatore. Tornatore trouxe novamente a aclamação mundial para o cinema italiano, principalmente de crítica e em festivais de cinema. Iniciou-se no teatro, depois fotografia, documentário e finalmente na direção de filmes. Em 1988, Tornatore encantou o mundo com o longa metragem “Cinema Paradiso”, um filme sobre memórias, amizade e amor pelo cinema. O filme venceu o Oscar de melhor filme estrangeiro e o Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes.
No embalo do grande sucesso de “Cinema Paradiso”, Giuseppe Tornatore realizou ainda cinco filmes inesquecíveis: “Estamos Todos Bem”, de 1990, “Uma Simples Formalidade”, de 1994, “O Homem das Estrelas”, de 1995, “A Lenda do Pianista do Mar”, de 1998, e “Malèna” de 2000.
O diretor italiano Giuseppe Tornatore
Viajando pelo belo e encantador “Cinema Paradiso”
Com um simples, mas profundamente comovente, enredo, o filme “Cinema Paradiso” nos envolve totalmente numa montanha russa de emoções, num sentimentalismo calcado em uma poderosa relação de amizade e de paixão pela magia do cinema. Com belas e envolventes imagens, o filme nos cativa e nos liberta com um rosto cheio de lágrimas.
Numa Itália derrotada após a segunda guerra mundial, em uma pequena cidade da Sicília, o garoto Totó (vivido pelo adorável ator-mirim Salvatore Cascio), travesso, doce, inocente e inteligente, ficou hipnotizado pelo cinema local, o ‘Cinema Paradiso’. Coroinha da igreja, Totó se envereda às escondidas para o mundo mágico do cinema e inicia uma amizade com Alfredo (Philippe Noiret), um rabugento projecionista de meia-idade, mas com um enorme coração, uma figura frustrada de não ter tomado um rumo diferente (possivelmente como cineasta), mas que ainda mantém viva a paixão pelo cinema. Totó, filho de uma viúva de guerra, se apega muito a Alfredo, quase numa relação paternal.
Todos estes acontecimentos chegam em forma de lembrança quando Totó, muito tempo depois em Roma, agora Salvatore, um cineasta de sucesso (Jacques Perrin, na fase adulta), mas amargurado, recebe a notícia de que seu grande amigo Alfredo faleceu. Depois de 30 anos, Totó voltará à sua terra natal. A partir daqui, o filme faz um longo flashback da vida de Totó, sua infância, adolescência (fase de vida interpretada por Marco Leonardi, com olhar apaixonado e sonhador) e, principalmente, suas aventuras no ‘Cinema Paradiso’ de sua pequena cidade, chamada Giancaldo. Foi ali que Totó aprendeu a amar o cinema e o seu local de maior alegria é a cabine de projeção.
Totó, o coroinha da igreja, e seu amigo Alfredo, o projecionista do ‘Cinema Paradiso’
Da cabine de projeção do velho Cinema Paradiso, onde Alfredo trabalha, Totó vai aos poucos se apaixonando pela sétima arte, descobrindo seus mistérios e ganhando repertório. Para ele, os filmes se tornam ao mesmo tempo um refúgio e uma escola, onde aprende sobre a vida. Vê faroestes, romances, policiais, aventuras, suspenses, comédias.
O mundo se revela diante dos olhos do menino por meio de imagens que lhe são apresentadas por Alfredo, misto de amigo, mentor e pai. Um guia, enfim, que lhe conduz até a idade adulta. Logo, o garoto aprende o ofício, e conforme os anos passam, acompanhamos seu amadurecimento, o primeiro amor, as dificuldades da vida. Enquanto isso, se desenrola certa evolução nas salas de cinema, ao mesmo tempo em que se mostra como o mundo moderno “matou” o cinema antigo, perdendo-se aquela magia de outrora.
Alfredo projetando um filme nas paredes da cidade e o encantamento de Totó
Existem inúmeras cenas memoráveis em “Cinema Paradiso”. Duas são, ao mesmo tempo, mágicas e tristes. A primeira é quando Alfredo projeta um filme nas paredes das casas da cidade para deleite de Totó e com um alvoroço feliz de seus simples habitantes. Outra cena memorável e triste é quando o cinema pega fogo e Alfredo fica cego, depois de um rolo de filme de nitrato explodir em sua cara. Para a felicidade de todos, o cinema é reconstruído por um cidadão da cidade, Ciccio, que investe seus ganhos na loteria de futebol. Salvatore (Totó), ainda criança, é contratado como o novo projecionista, pois é a única pessoa que sabe fazer funcionar as máquinas.
Alfredo, já cego, e seu amigo e pupilo Totó, crescido e se aprofundando no cinema
Salvatore conhece Elena (Agnese Nano), seu primeiro amor inesquecível, e conquista o coração dela. O casal vive momentos de um perfeito e lindo amor. Entretanto, o pai dela, um rico banqueiro, desaprova o romance. Com a mudança de Elena e sua família, Salvatore, desiludido, deixa a cidade para o serviço militar.
No seu retorno, Alfredo exorta Salvatore a deixar sua pequena cidade, Giancaldo, permanentemente, aconselhando que a cidade é pequena demais para ele realizar seus sonhos e que ele nunca deve ceder à saudade. Salvatore obedece a Alfredo. Eles se abraçam em prantos e Salvatore deixa a cidade para perseguir seu futuro como cineasta em Roma. Ele leva consigo sua desilusão amorosa, mas também suas esperanças.
Elena, um grande e desiludido amor, e a partida de Salvatore para Roma
Salvatore, já adulto e realizado em termos profissionais, voltou para sua terra natal, sua verdadeira casa, para assistir ao funeral de Alfredo. Nesse retorno, que é um ajuste de contas com o passado, o adulto e bem sucedido cineasta Totó vê-se diante de memórias tão belas quanto dolorosas. É um reencontro amargo com seu passado, porém necessário e redentor. Embora a cidade tenha mudado muito, ele agora entende por que Alfredo pensava que era importante que ele partisse e conquistasse seu sonho de infância.
A viúva de Alfredo diz a ele que o velho Alfredo seguiu os sucessos de Salvatore no cinema com orgulho e ele deixou algo para ele: um rolo de filme sem rótulo e o banquinho velho em que Salvatore uma vez subiu para operar o projetor. Salvatore fica sabendo que, infelizmente, o Cinema Paradiso será demolido para dar lugar a um estacionamento. No funeral, ele reconhece os rostos de muitas pessoas que iam ao cinema quando ele era o projecionista.
O Cinema Paradiso da pequena cidade de Giancaldo e as lembranças de Salvatore
Ao retornar a Roma após o funeral, Salvatore tem uma grata surpresa e nós também, espectadores. O personagem assiste a um rolo de cenas de beijos e abraços, censuradas e cortadas décadas atrás pelo pároco local, e mais tarde editadas por Alfredo como herança para seu antigo ajudante e pupilo. A emoção de Salvatore diante dessas imagens “roubadas” é a nossa. É o cinema em todo seu esplendor. Ao assistir essas imagens “proibidas”, românticas, de desejos doloridos e frenesi lascivo, Salvatore se redime, faz as pazes com seu passado com lágrimas nos olhos.
Essa cena final é uma das mais belas já filmadas. De maneira poética, traduz todos os sentimentos que estavam presos no nosso protagonista Salvatore. Tais sentimentos vão além, servindo como uma carta de amor ao próprio cinema, ao imaginário, aos cinéfilos, a nós mesmos.
A surpresa e a redenção emocional de Salvatore com o presente de Alfredo: as cenas cortadas
Paixão e lágrimas de “Cinema Paradiso”
“Cinema Paradiso” é um filme pungente, singelo e apaixonante, uma das mais belas declarações de amor ao cinema. Com lindas imagens, o filme atinge nosso íntimo, vai fundo no nosso âmago, recordando-nos as lembranças do passado e dos tempos de nossa própria infância. E não é apenas o personagem Totó que é arrebatado neste universo fascinante. É fácil para qualquer amante do cinema se identificar com as cenas que o diretor Giuseppe Tornatore nos apresenta em seu filme, tesouros que povoam as telas do ‘Cinema Paradiso’ e encantam, seduzem, embriagam nossa própria memória cinematográfica.
É com extrema habilidade e apurada emotividade que o diretor retrata a passagem do menino da infância triste (Totó), povoada pela morte do pai na guerra, para o universo adulto (Salvatore), através do cinema. É de forma poética que ocorre este amadurecimento do protagonista, que tem sua sensibilidade e seu olhar educados pelas imagens enebriantes do cinema.
A grande beleza de “Cinema Paradiso”, um grande clássico do cinema mundial, está na sua extrema sensibilidade e simplicidade. É uma obra feita, literalmente, de lágrimas, que vertem tanto na trama quanto na platéia que o assiste, em perfeita sintonia. Um filme sentimental e irresistível para quem se permite a emoção plena, à flor da pele. Machuca o coração, e logo após, o reconforta, como que fosse um longo, quente e apertado abraço de alguém amado.
“Cinema Paradiso”, 1988, e o diretor Giuseppe Tornatore
Cenas de “Cinema Paradiso”, 1988
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