O cinema mundial na primeira década do século XXI
Um perfil da primeira década do século XXI
O século XXI se tornou o século da globalização econômica e financeira e da revolução da tecnologia e dos computadores. O mundo estava entrando numa fase de criação de organismos multilaterais de negociação diplomática e econômica. Houve uma crise global em 2008 que reduziu o crescimento econômico dos países.
Na política internacional, este período é marcado por ações militares dos Estados Unidos em países do Oriente Médio, na chamada Guerra ao Terrorismo: Guerra do Afeganistão e Guerra do Iraque. Os conflitos foram desencadeados pelos atentados terroristas ao World Trade Center em Nova York em 11 de setembro de 2001.
Os países da União Europeia passam, em sua maioria, a adotar o euro como moeda comum entre os países membros do bloco e para as transações financeiras internas, substituindo as moedas nacionais. Nos países da América Latina, partidos de esquerda chegam ao poder através de eleições. Cuba experimenta uma certa abertura, apesar do bloqueio à ilha. A China vai se tornando a segunda maior potência econômica do mundo.
No cinema, a primeira década do século XXI foi promissora. Filmes americanos foram produzidos com roteiros bem elaborados e onde a tônica foram os conflitos humanos, principalmente a violência urbana, crimes, mas também teve abordagens históricas. Pelo mundo afora, o perfil foi de filmes reflexivos e bastante diferenciados, misturando novos diretores com aqueles já consagrados.
Uma seleção de filmes americanos de 2000 a 2009
Em 2000, um filme cheio de confusões e de conflitos ilícitos foi lançado e dirigido pelo talentoso diretor Steven Soderbergh. Seu nome: “Traffic”. Explora o narcotráfico de diversas perspectivas: de um usuário, de um capanga, de um político e de um traficante. Suas histórias são construídas juntas ao longo do filme, ainda que os personagens não se conheçam. Essas vidas vão experimentar perda pessoal e desespero numa guerra perdida contra as drogas, e o sentimento é de impotência.
Em 2001, um espetacular musical foi filmado: “Moulin Rouge”, dirigido por Baz Luhrmann. No enredo, Christian, um escritor inglês, viaja para Paris para se juntar à revolução boêmia. Ele visita o maior clube noturno da cidade, Moulin Rouge, e se apaixona por sua estrela e cortesã, Satine. O filme é visualmente maravilhoso de se ver, multicolorido, alegre e personagens multifacetados, todos loucamente artísticos. Além disso, faz uma mistura de músicas modernas com ambientes históricos.
Em 2002, o cineasta vanguardista David Lynch lançou “Cidade dos Sonhos”. Navegando num suspense psicológico, o filme conta a história de Betty (Naomi Watts), uma tímida aspirante a atriz que se muda para Los Angeles e encontra Rita (Laura Harring), uma misteriosa mulher que acabara de perder a memória num acidente de carro. O filme não expõe suas intenções para a narrativa e leva o espectador para uma estranha história de amor numa cidade com encantos e mistérios.
“Traffic”, 2000
“Moulin Rouge”, 2001
“Cidade dos Sonhos”, 2001
Cenas de “Traffic”, 2000
Cenas de “Moulin Rouge”, 2001
Cenas de “Cidade dos Sonhos”, 2002
Em 2003, o diretor Clint Eastwood lançou um filme de temática pesada, transgressora. Trata-se de “Sobre Meninos e Lobos”. O filme é um drama policial em torno de uma investigação de um assassinato. Durante a caçada, três amigos de infância se envolvem fortemente fazendo com que voltem a fatos e segredos marcantes do passado. Misturando suspense com doses psicológicas brutais, o filme desnuda as personalidades feridas do trio de protagonistas num mundo de violência e dor.
Também em 2003, o filme “Cold Mountain”, dirigido por Anthony Minghella, conseguiu emocionar a todos. Se passando na Guerra Civil Americana do século XIX, o filme mostra a história de amor entre Inman Balis (Jude Law) e Ada Monroe (Nicole Kidman). A guerra os separa e a jornada de reencontro do casal é dura, sentimental e trágica. O filme tem uma bela fotografia, boa ambientação de época, um pouco de melodrama e atuações sensíveis do elenco. Cativou o público e chamou a atenção da crítica.
O diretor indiano radicado nos Estados Unidos, M.Night Shyamalan, rodou em 2004 uma história de fantasia em tons muito sombrios. Trata-se de “A Vila”. No enredo, um vilarejo isolado vive com medo de monstros desconhecidos da floresta circundante. Mas quando um morador da comunidade fica gravemente ferido, uma garota cega sai para a floresta em busca de ajuda exterior. O filme fala de dor, perdas, utopia comunitária e estratagemas para criar cooperação e suporte para uma vida afastada do mundo urbano hostil.
“Sobre Meninos e Lobos”, 2003
“Cold Mountain”, 2003
“A Vila”, 2004
Cenas de “Sobre Meninos e Lobos”, 2003
Cenas de “Cold Mountain”, 2003
Cenas de “A Vila”, 2004
Em 2005, o novato diretor Paul Haggis realizou “Crash – No Limite”, um filme tão dolorido quanto verdadeiro. Questões de raça, classe, família e gênero emergem em uma série de histórias envolvendo moradores de Los Angeles. Diversos personagens das mais variadas origens se cruzam em um incidente. Os diferentes estereótipos que a sociedade criou para esses grupos étnicos e sociais afeta seu julgamento, crenças e atitudes, o que causa problemas e tensões para todos. Preconceito, racismo, ignorância, injustiça, tudo está presente.
Em 2007, um novo diretor, Paul Thomas Anderson, filmou “Sangue Negro”. Como de costume, o ator Daniel Day Lewis dá um show de interpretação numa história que se passa no início do século XX, na fronteira da Califórnia, abordando um mineiro determinado e que busca enriquecimento na extração de petróleo. A riqueza traz com ela uma crise no relacionamento dele com um pastor local. Um filme denso, psicológico, mostrando que a luta por sucesso empresarial e fortuna não significa felicidade.
Também em 2007, a talentosa dupla Ethan e Joel Coen rodam um filme perturbador. Trata-se de “Onde Os Fracos Não Tem Vez”. Com uma temática que mistura drogas, dinheiro e crimes, o filme é poderoso ao abordar um assassino psicótico, sem senso de humor e piedade, que vai no encalço de um simples caçador que encontra dinheiro do narcotráfico no Texas, década de 80. Psicológico e violento, os irmãos Coen trabalham mais uma vez com o acaso, acidentes de percurso e perseguições.
“Crash – No Limite”, 2005
“Sangue Negro”, 2007
“Onde os Fracos Não Têm Vez”, 2007
Cenas de “Crash – No Limite”, 2005
Cenas de “Sangue Negro”, 2007
Cenas de “Onde os Fracos Não Tem Vez”, 2007
Diretores de filmes americanos que se destacaram na primeira década do século XXI. Pela ordem: Steven Soderbergh, Baz Luhrmann, David Lynch, Anthony Minghella, Paul Haggis e Paul Thomas Anderson
Uma seleção de filmes pelo mundo de 2000 a 2009
Em 2000, o cineasta de Taiwan Ang Lee rodou um filme que se passa na Dinastia imperial chinesa Qing. O filme difundiu o gênero asiático wuxia/ação e conta a história de um guerreiro, Li, que, quando sua espada é roubada, terá de voltar à ativa para recuperá-la. Nessa aventura, o filme nos brinda com grandes coreografias de lutas e efeitos especiais, ao mesmo tempo delicados e espantosos. E ainda, nos apresenta uma bruxa chinesa como vilã. O destaque vai para as protagonistas femininas e suas performances marciais.
“O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”, realizado em 2001 e dirigido pelo francês Jean-Pierre Jeunet, foi surpreendente. O filme é cheio de cores, intenso, jovial e parece uma fábula sobre a felicidade. Amélie, a personagem principal, é uma jovem que cresceu isolada e que se engaja na realização de pequenos gestos a fim de ajudar e tornar mais felizes as pessoas ao seu redor. Focada em seu mundo imaginativo, Amélie espalha alegria e segue uma jornada onde ela encontra o amor verdadeiro.
A segunda guerra mundial retornou com força ao cinema na direção do polonês Roman Polanski, quando lançou em 2002 “O Pianista”. O filme é baseado na vida do pianista judeu-polaco Wladiyslaw Szpilman, interpretado por Adrien Brody. Com a invasão nazista em Varsóvia em 1939, ele vê seu mundo ruir. E ao perder o contato com sua família, ele se esconde nas ruínas da cidade para sobreviver. Um filme poderoso sobre perdas, sofrimento e resiliência.
“O Tigre e o Dragão”, 2000
“O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”, 2001
“O Pianista”, 2002
Cenas de “O Tigre e o Dragão”, 2000
“O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”, 2001
Cenas de “O Pianista”, 2002
O dinamarquês Lars Von Triers rodou em 2003 um drama de vanguarda chamado “Dog Ville”. O filme é dividido em 10 partes – cada uma com créditos e introdução narrada – sendo 1 prólogo e 9 capítulos. A trama acontece em um único local, uma cidade pequena dos Estados Unidos chamada “Dogville” (que na verdade é um palco de teatro), situada no fim de uma estrada que vai até as Montanhas Rochosas. O filme é uma metáfora sobre a situação social e psicológica dos Estados Unidos na época da grande depressão econômica nos anos 30.
O talentoso cineasta de Hong Kong, Wong Kar Wai, realizou em 2004 o filme “2046”. Trata-se de um drama romântico e se passa na década de sessenta em Hong Kong. É um filme onde a ambientação é fundamental para dar um tom futurista a uma história de amor. Temos vielas escuras, candeeiros à meia luz, almas em câmera-lenta, destinos errantes, amores perdidos e um tom de saudade. Tudo isso numa narrativa de ficção científica.
Os premiadíssimos irmãos belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne rodaram em 2005 o filme “A Criança”. Nos subúrbios de Liège, na Bélgica, um jovem casal sobrevive do subsídio de desemprego e pequenos roubos. Nesta precária situação, quando surge um bebê na vida do casal, um pai imaturo e desinteressado vislumbra uma boa grana no mercado negro da adoção. O filme discute as relações humanas em seres marginalizados pela degradação causada por um mundo extremamente competitivo.
“Dog Ville”, 2003
“2046”, 2004
“A Criança”, 2005
Cenas de “Dog Ville”, 2003
Cenas de “2046”, 2004
Cenas de “A Criança”, 2005
O sempre energético e modernista espanhol Pedro Almodóvar lançou em 2006 o filme “Volver”. No enredo, uma jovem visita sua aldeia ancestral para assistir ao funeral de sua tia. No entanto, para seu horror, ela encontra o fantasma de sua mãe que morreu anos atrás. É um filme sobre mulheres e sobre a morte. Ainda que tenha tons sobrenaturais, não é fantasioso nem melodramático. E como sempre acontece em filmes de Almodóvar, é muito colorido.
Em 2008, o filme chamado “O Menino do Pijama Listrado”, dirigido por Mark Herman, foi lançado e surpreendeu com um enredo que fala do Holocausto nazista na segunda guerra mundial através de duas crianças, sendo que uma é judia e presa num campo de concentração, que se separam e conversam por uma cerca eletrificada. Quando essa amizade cresce e os encontros entre os dois garotos se sucedem, essa relação vai se tornando muito perigosa e inesperada.
Por fim, em 2009, o sempre inquietante e radical cineasta austríaco Michael Haneke rodou “A Fita Branca”. Lançado em preto e branco, o filme oferece uma representação sombria da sociedade e da família em uma aldeia do norte da Alemanha pouco antes da Primeira Guerra Mundial. De acordo com o próprio diretor, o filme é sobre as raízes do mal. Antevendo um futuro autoritário e violento (o nazismo?), o filme trata de intolerância e falta de humanidade que existem dentro de cada pessoa, até mesmo crianças.
“Volver”, 2006
“O Menino do Pijama Listrado”, 2008
“A Fita Branca”, 2009
Cenas de “Volver”, 2006
Cenas de “O Menino do Pijama Listrado”, 2008
Cenas de “A Fita Branca”, 2009
Diretores estrangeiros que se destacaram na primeira década do século XXI. Pela ordem: Ang Lee, Jean-Pierre Jeunet, Lars Von Triers, Wong Kar Wai, Jean-Pierre e Luc Dardenne, Michael Haneke
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